Sombra chique
Alguns posts atrás, publiquei um texto sobre os barcos de apoio, conhecidos lá fora por Chase Boats. Agora, volto ao assunto com algo que fica difícil de batizar em português, de uma forma que não seja “iate ou navio de apoio”, conhecidos lá fora por Shadow Boats.
O chamado Shadow ou SupportVessel nada mais é do que um outro iate, que tem a função de complementar os espaços e a logística do barco-mãe (Motheryacht). Criado inicialmente para dar suporte a iates que realizavam expedições, passou a ocupar um lugar de destaque no lazer de seus proprietários.
Shadow Yacht em operação
Tudo começa com a construção ou adaptação de um iate ou outra embarcação à nobre função de apoio de um iate-mãe. Dentre suas funções estaria transportar equipamentos e embarcações de menor porte, a fim de atender as necessidades do iate onde o proprietário e convidados ficariam acomodados. Portanto, sem a necessidade de espaçosas cabines e salões, este volume passaria a ser dedicado a alojar uma quantidade enorme de brinquedos flutuantes, como botes de apoio, lanchas de pesca, motos-aquáticas, infláveis, hidroaviões, submarinos, pranchas de todos os calibres além de oficinas de reparo, paióis para peças sobressalentes, câmaras frigorificas, despensas para alimentos, lavanderia, ambulatório,spa, academia, central de comunicação, oficina, alojamento para os tripulantes de ambos, mas principalmente algo complicado de se instalar e operar em um “barco-mãe” que seria um amplo heliponto, apto a receber e até estivar e transportar aeronaves de diversos tamanhos.
Os estaleiros europeus não perderam tempo e lançaram vários projetos de barcos de apoio, de 18 a mais de 100 metros de comprimento, com opções dedicadas a todos os tamanhos e necessidades. Porém, não se iluda, estes barcos não são rebocadores forrados de fórmica e cheirando a oficina, são iates diferenciados que possuem elevado padrão de conforto, mesmo não realizando o pernoite do proprietário, pois o mesmo o utiliza como extensão de seu Iate principal, contando com ele para diversões aquáticas, spa, acomodação de mais hóspedes e mesmo para embarque e desembarque através de seu já citado heliponto.
De forma pouco mais econômica, é possível transformar um pequeno navio de apoio e suprimento de plataformas de petróleo, que chamaremos genericamente de SupplyVessel, em um SuperyachtSupportVessel. Vale dizer que esta transformação não é das mais baratas. Além de herdar equipamentos de propulsão de necessidade duvidosa, como inúmeros motores destinados ao DP (Posicionamento Dinâmico) e um consumo de combustível que costuma ser bastante elevado. Como vantagem estes navios já nascem atendendo as mais duras regras de segurança e possuem enormes espaços, o que permite instalar o já comentado heliponto com toda a estrutura necessária, assim como garagens e sistemas de lançamento para todo tipo de veículo.
O Thunderbird 2 é utilizado para lançamento de um mini-submarino
Um fator importante é que o custo de construção de um Iate luxuoso tradicional é bastante elevado, e investir este capital em área construída dedicada exclusivamente ao proprietário e convidados, deixando as áreas técnicas a bordo do barco de apoio, seria o mais inteligente a se fazer. Com isto, sobra mais espaço para piscinas, áreas gourmet, restaurantes, bares, boates e salas de cinema, deixando a oficina, paióis e outros espaços menos cotados de fora.
Apesar de ser uma moda recente, anos atrás visitou a Marina da Glória a pequena frota de um empresário norte-americano que passou algum tempo por aqui. O barco-mãe tinha algo como 120 pés, e se fazia acompanhar de um trawler de 90 pés, equipado com oficina e despensa, e ainda escoltava uma lancha de pesca esportiva de 70 pés, cuja tripulação se dedicava a pescar Marlins ao redor do mundo, no sistema tag-n-release (pesca-etiqueta e solta, em tradução livre). Assim como ele, hoje em dia, vários outros Armadores adotaram este sistema de “flotilha” e o próprio Roman Abramovich encomendou dois SeaAxe’s de 50 metros cada, para apoiar seu Megayacht Eclipse de 162,5 metros (533 pés). Estas “pequenas” embarcações tem velocidade máxima de 28 metros e atendem, segundo consta, às necessidades do armador.
Um é bom, dois é melhor ainda!
A pratica é que o SupportVessel chegue ao local da diversão antes da chegada do iate-mãe, assim os convidados já irão dispor dos brinquedos quando chegarem ao destino, e não terão de aguardar a tripulação “montar a praia” após terminada a manobra de fundeio.
No Brasil, que não possui ainda muitos superiates em suas águas, não se tem notícias que indiquem que algum SSV estará em operação nos próximos meses, mas certamente algo semelhante deverá aparecer por aqui em breve. Levando em consideração que os iates produzidos aqui costumam ter pouco ou nenhum espaço dedicado a manutenção, estocagem de peças e alimentos, sem falar na pobre acomodação de tripulantes, nada impede que possamos identificar lanchas mais antigas, modificadas e passando a servir de apoio para iates de maior porte. Nelas, poderiam ser guardados motos e pranchas, botes e peças, alimentos e bebidas além de permitir até o descanso de tripulantes que passaram a noite acompanhando turmas de jovens em baladas, e que de dia precisam se recuperar para a próxima noitada, enquanto seus pares atendem aos proprietários e convidados de outras gerações, durante o dia.
Alguns anos atrás uma família de empresários brasileiros comprou e reformou uma grande escuna, que passou a operar uma enorme e muito bem equipada cozinha, apta a atender ao grande número de familiares e convidados dentro de sofisticados padrões gastronômicos. Ela se posiciona em algum lugar da baía da Ilha Grande e a cada momento um dos barcos da família recorre a ela para consumir alimentos, bebidas e conforto, utilizando-a como um tipo de barco-restaurante privado, que presta apoio especializado a todos. No caso do SSV, eles viajam com o barco-mãe para outras regiões, prestando o suporte logístico necessário a frota, permitindo uma experiência única a seus proprietários.
Um transportador de flotilha
Seria como enviar o barco de apoio a Fernando de Noronha e ao chegar, você teria um pequeno submarino à sua disposição, assim como uma lancha de pesca e um bote para operação de mergulho autônomo. Caso necessitasse, poderia utilizar o estoque de combustível e água do barco de apoio e, ainda, desembarcar (com sorte) um quadriciclo na praia do Porto. Isto sem falar em SUP’s, bicicletas de trilha e até um ultraleve, tudo para seu deleite.
Ao que parece, este mercado não tem mesmo limite. O que começou com um pequeno bote de apoio, depois virou um Chase e agora cresceu para um navio de apoio, também inclui enormes flutuantes rebocáveis, verdadeiras ilhas artificiais onde cantos-gourmet se misturam com piscinas e toboágua gigantes. Quem sabe, no futuro, um magnata deste não vai comprar e adaptar um porta-aviões, a fim de poder pousar seu jato em seus giros ao redor do mundo.
Mesmo nascendo à sombra de um grande Iate, estes barcos já possuem luz própria e um lugar garantido no mercado, pois aliam mobilidade, estilo, segurança e permitem o acesso ao que há de mais moderno em termos de diversão. Tudo em nome do prazer!
Alvaro Otranto é navegador de longas travessias, um dos mais antigos colaboradores da revista Náutica e criador da Moana Livros, primeira livraria na internet especializada em temas de mar e aventura.
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