Tudo sobre o barco

Por: Redação -
20/05/2016

Um dos primeiros trabalhos que um engenheiro naval ganha quando começa a trabalhar em um estaleiro é escrever um manual do proprietário. Devo confessar que este não é um trabalho para mim, e por sorte nunca ninguém me pediu isto, mas os engenheiros mais novos que trabalham comigo, vira e mexe, estão envolvidos em escrever especificações e manuais para as mais diversas finalidades.

O problema de escrever um manual é que uma ou duas informações erradas impressas ou digitalizadas podem ser fatais e arruinar todo o trabalho e, certamente, implicam em tirar toda a credibilidade do resto do manual. Certamente, o dono do barco, seu comandante ou seu marinheiro, jogariam o manual pela borda a fora. A confiabilidade é o item mais importante do trabalho.

Quando eu comecei a construir barcos os manuais eram um conjunto de poucas folhas impressas, que o dono do barco recebia na data da entrega do barco, mas hoje em dia, na era digital, onde tudo está digitalizado na internet, não existe desculpas para o estaleiro não produzir um documento fiel a construção do barco.  A situação se complica um pouco quando o estaleiro não consegue vender e fabricar dois barcos com os sistemas idênticos. Isto, aliás, é típico de fabricantes que não tem produção em grande escala. Mesmo barcos acima de 30 pês acabam tendo especificações diferentes. Barcos maiores são de fato um problema.

Tirando o casco de fibra de vidro, que é praticamente padrão entre todos os barcos da série, as modificações ou versões tem motor, caixa de reversão, hélice, gerador, sistemas de ar-condicionado, painel elétrico e acessórios opcionais diferentes. Outro problema também é que a localização de cada um deles que muda de barco para barco. Isto implica também em mudança na distribuição de peso, centro de gravidade e ângulo como o barco plana. O comportamento no mar assim como a velocidade final e de cruzeiro também irão ser diferentes. Editar uma só versão do manual não irá cobrir todos os barcos produzidos daquele modelo. Agora imaginem ter que modificar cada manual do proprietário para cada barco vendido?

Para o construtor, no fundo, o manual além de ser um item obrigatório requerido pela Capitania dos Portos para registrar um barco, serve para proteger o próprio fabricante contra algum mau uso da embarcação que poderá gerar um processo administrativo contra ele.  No manual sempre devem constar todos os sinais de alerta, cuidado e perigo.  Embora isto seja bem verdade, não se espera que o estaleiro contrate advogados para escrevê-lo, mas certamente eles vão ler antes de ser publicado. Quem coordena a confecção do manual, seja ele produzido pelo próprio staff no estaleiro, ou terceirizado por uma empresa especializada, precisa evitar que o dono do barco pegue o telefone e ligue para tirar alguma dúvida com você.

Hoje em dia, os manuais devem ter diagramas com todos os sistemas de bordo e serem fáceis e acessíveis de ler. Usar fotos com o equipamento real é mais interessante do que símbolos de engenharia para circuitos elétricos, que nem mesmo eu compreendo. Uma boa tática é criar versões para tablet ou telefone móvel de modo que o comandante possa chegar do lado do equipamento a ser inspecionado e explodir a figura em detalhes. Diagramas valem mais que mil palavras.

Para um construtor global, que desenvolve o projeto na Itália, contrata a confecção do manual na Índia, constrói o barco na China e vende no Oriente Médio o desafio é muito maior.  A melhor maneira é começar fazendo uma expedição no barco e catalogar algumas centenas de fotos em alta definição de cada equipamento e sistema do barco com sua localização precisa. Se for necessário usar sempre uma escala no quadro da foto. Assim será possível escrever a primeira versão do manual que deve ter o link do fabricante e modelo de cada equipamento. Com um ou dois toques na ela é possível descobri tudo sobre o funcionamento do sistema.

A ANBT e a ACOBAR acham que o manual do proprietário é tão importante que dedicaram um capítulo na NBER-14575 (Requerimento para a Construção de Embarcações de Recreio) que pode servir como roteiro do que é importante constar em qualquer documento. No final, um bom manual funciona para os dois lados. O construtor oferece um bom produto e o cliente fica satisfeito. Certamente vai voltar!

 

Jorge Nasseh é especialista em construção e composites e costuma viajar os quarto cantos do mundo em busca de novidades no meio náutico.

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