A verdade sobre o fim do Pilar Rossi: o que levou Nelson Piquet a desmanchar seu iate
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Em uma espécie de eutanásia náutica, aplicada a um casco sem chance de sobreviver, o Pilar Rossi — celebrado iate trimarã do ex-piloto Nelson Piquet — foi sacrificado no início deste ano, depois de mais de três décadas de mar. O gesto de misericórdia aconteceu em Camocim, cidade litorânea do Ceará localizada próximo à paradisíaca Jericoacoara.
Não teve cerimônia de adeus nem cruzeiro de despedida. Só o ruído de serras elétricas e o fogo azul dos maçaricos cortando em pedaços o velho casco de aço. Do glamour dos bons tempos, em que o piloto com inclinação náutica morava a bordo num porto de Mônaco, só restou poeira e ferro retorcido.
Parece inacreditável que um gigante de 64,35 metros de comprimento (211 pés) pudesse desaparecer assim, da noite para o dia. Mas foi o que aconteceu. Diante da notícia, que causou enorme repercussão ao ser publicada em primeira mão por NÁUTICA (leia aqui), uma pergunta ficou sem resposta: afinal, por que o Pilar Rossi foi desmanchado?
A reportagem de NÁUTICA foi em busca de respostas, e as encontrou junto a um velho amigo e colaborador do tricampeão mundial de F1: o despachante aduaneiro Sérgio Quinderé Amora, da Ramora Serviços de Despachos Aduaneiros, do Ceará.
Para quem não sabe, despachante aduaneiro é o profissional que trata de produtos estrangeiros junto à Receita Federal. No caso do Pilar Rossi, a ajuda de Amora foi essencial, porque o barco tem bandeira das Ilhas Cayman e não está registrado em nome de Nelson Piquet Souto Maior e sim de uma empresa estrangeira que tem o ex-piloto como sócio principal.
“No Brasil, é possível admitir o barco temporariamente para uso privado por até três meses, prazo prorrogável por até igual período; depois disso, o barco obrigatoriamente tem de deixar as nossas águas”, explica Amora.
Mas, de modo conclusivo, por que o tricampeão fez a opção por uma medida tão radical, como o desmanchar seu iate, se o Pilar Rossi era um símbolo do sucesso que ele alcançou na Fórmula 1?
“Por que a recuperação da embarcação se tornou inviável financeiramente”, responde o despachante aduaneiro. “Por questões pessoais, até tentamos recuperá-lo, já que esse barco tem uma história e vínculos pessoais com o Piquet.
Isso aconteceu em outras oportunidades, como quando aumentamos a área da popa; ou quando transformamos o monocasco em um trimarã; ou ainda quando alongamos a proa e transformamos o iate em um veleiro, ou, melhor dizendo, um híbrido das duas coisas”, esclarece Amora. “Dessa vez, porém, toda a estrutura e os cascos estavam severamente comprometidos”.
Esse diagnóstico, segundo ele, só foi possível após o início dos trabalhos, em Camocim, o que impediu, inclusive, a remoção do Pilar Rossi para outras águas, onde talvez pudesse ser vendido e restaurado.
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“Nossa legislação só dá duas opções nesses casos: entregar o bem à Receita Federal do Brasil, para um futuro leilão, ou destruí-lo por completo”, lamenta o profissional encarregado do encaminhamento, tramitação e despacho de papéis junto às repartições públicas. “Tentamos entregá-lo, mas a alfândega não aceitou, por conta do estado em que o barco se encontrava, além da falta de espaço para abrigá-lo e do pequeno número de interessados, dado ao tipo de produto e valor”, garante.
O resultado foi aquele que NÁUTICA revelou neste site, após receber a informação do leitor Adauto Correa Motta Júnior, morador de Camocim que fotografou a embarcação em seus momentos derradeiros. “O Pilar Rossi teve seu fim decretado na placidez do Rio Coreaú, em Camocim, Ceará, naquele que talvez seja o estuário mais bonito do estado. Conversei com um rapaz que participou da operação e ele confirmou que o barco foi cortado no maçarico e a ‘pedaceira’ está solta na beira do rio. Não há mais nada”.
Embora com os cascos em processo de corrosão, o trimarã tinha um “enxoval” de primeiríssima linha, material valiosíssimo. Nada, porém, pode ser aproveitado. “Infelizmente, o destino de tudo o que havia a bordo do iate foi a destruição. Dos painéis aos motores, passando por geradores, mobiliário, dessalinizadores e tudo que compunha o maravilhoso Pilar Rossi, não sobrou nada”, afirma Amora.
“Tudo foi cortado e apresentado à Receita Federal do Brasil, que concluiu o processo. Só nos resta vender a sucata por peso; realmente um fato triste”, ele lamenta, traduzindo, também, o sentimento de Nelson Piquet, com quem conversou após a conclusão do desmanche.
“Falei rapidamente com o tricampeão mundial, que tinha uma relação íntima com o barco, além de uma grande paixão pelo mar. Como uma pessoa discreta, ele preferiu não dizer nada publicamente. Mas posso dizer que ficou chateado com os comentários maldosos e equivocados sobre o que teria motivado o desmanche do barco. Chegaram em falar em golpe no seguro, mas o barco sequer estava segurado. Por isso, espontaneamente, resolvi fazer esse esclarecimento”, conta Amora.
A metamorfose de um iate
Primeiro, o Pilar Rossi ganhou cascos laterais e virou trimarã. Depois, esticou na proa. Por fim, antes de ser desmanchado, o iate de Piquet virou um veleiro!
Olhe bem para esta sequência de fotos abaixo. Não, não são barcos diferentes! Trata-se do mesmo Pilar Rossi, só que em épocas diferentes. A primeira, em 1989, ao ser comprado, com sua configuração original e convencional para um barco com então 110 pés; a segunda 12 anos depois, ao ganhar dois cascos extras na popa e virar uma espécie de trimarã; e a terceira, depois de ter sua proa e sua popa estendidas em nada menos que 24 metros e — suprema ousadia — ganhar mastros, velas e virar um veleiro movido também a motor.
Sem alarde nem cerimônias de (re)batismo, a embarcação, originalmente com 33,5 metros (e agora já passando dos 64 metros, ou 210 pés — quase o dobro do comprimento inicial!), passou por três cirurgias ultraradicais, todas feitas não apenas para otimizar o desempenho, mas sobretudo para livrar seu famoso dono de um prosaico incômodo: o enjoo no mar.
Mesmo não admitindo facilmente, Piquet é um marinheiro sensível ao mais trivial dos tormentos náuticos. E para se livrar desse estraga-prazeres, não poupou esforços nem dinheiro.
Na primeira grande reforma, executada pelo estaleiro carioca Rionave, o Pilar Rossi ganhou dois enormes flutuadores laterais, de aço, que não só ampliaram sua boca original (de sete metros para 14 metros) como o transformaram de monocasco em trimarã — ficou tão largo que passou a levar, sobre as asas da popa, uma outra lancha de um lado e alguns jets do outro.
Na segunda intervenção, ganhou nada menos que 12 metros a mais de comprimento, desta vez na proa, que esticou feito um milagre da engenharia naval. No espaço extra, foram instaladas, entre outras benfeitorias, uma sala de musculação e uma piscina, esta com uma peculiaridade: por conta de um jato d’água que empurra o banhista para trás, era possível nadar sem parar, ainda que sem sair do lugar. Por fim, antes do derradeiro desmanche, o Pilar Rossi deixou de ser um barco a motor e virou um veleiro. Ou, melhor, um híbrido das duas coisas. Eram dois mastros e 1 400 metros quadrados de área vélica.
Próximo passo, um novo barco?
Apaixonado por barcos e considerado um exigente bon vivant náutico, Nelson Piquet nem bem acabou o desmanche do Pilar Rossi e — dizem — já planeja a construção de um novo barco. Quem sabe Piquet não nos faça uma surpresa qualquer dia desses e apareça no comando de outra embarcação? Para pessoas próximas, ele teria revelado o desejo de comprar um barco menor, na faixa os 70 pés, com duas suítes e três motores a jato! Fica a torcida para que seja verdade.
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