Ex-dono da lancha de JK largou tudo para resgatar de jet mais de 150 animais no RS
Gerard Souza contou à NÁUTICA sobre os onze dias de voluntariado intenso nas regiões afetadas pelas enchentes
A incapacidade de ficar de braços cruzados enquanto as notícias sobre a tragédia no Rio Grande do Sul (RS) se multiplicavam foi o que fez Gerard Souza largar o conforto do lar, em Brasília, e se unir à equipe de resgate de animais na onda de solidariedade que percorre o território gaúcho.
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Conhecido por restaurar a lancha Gilda — que pertenceu ao ex-presidente Juscelino Kubitschek e se tornou uma das mais famosas do Brasil — o empresário carioca uniu conhecimentos náuticos à paixão que tem pelos bichos para ajudar a salvar mais de 150 animais afetados pela calamidade. Na lista de socorridos estavam 111 cachorros, 37 gatos, oito cavalos e outros tantos porcos, perus e galinhas.
Eu tenho onze cachorros adotados. Quando vi aqueles vídeos de cães e gatos resgatados, comecei a chorar copiosamente. Até que pensei ‘não vou ficar aqui chorando, vou para lá ajudar’– contou, em entrevista à NÁUTICA
A ideia de Gerard, que é um dos mais antigos concessionários da Sea-Doo no Brasil — com a Villa Náutica –, era comprar um jet especificamente para a ação. O primeiro passo que deu foi entrar em contato com uma das concessionárias da Sea-Doo de Santa Catarina, a MegaJet. Ao descobrirem seu propósito, no entanto, os donos do local não hesitaram em ceder a moto aquática e uma carreta de forma totalmente gratuita.
O que era para ser cinco dias de voluntariado intenso se transformou em onze. O empresário até chegou a voltar para Brasília, mas não aguentou ficar dois dias em casa quando descobriu que as chuvas voltaram a assolar o estado e provocaram mais vítimas. Novamente, decidiu agir.
Por dentro dos resgates de animais no RS
Gerard foi um dos muitos voluntários a auxiliar na base de resgates montada na Usina do Gasômetro, antigo ponto turístico de Porto Alegre. De lá saíam os barcos que levavam remédios, comida e água para pessoas ilhadas, bem como os destinados ao resgate de animais no RS. A gama de embarcações era tão diversa que ia de jets modernos a canoas de madeira equipadas com motores dos anos 1990.
Como é de se imaginar, socorrer os bichinhos não é tarefa fácil. Para chegar até eles foi necessário quebrar muros, estourar tijolos, desviar de inúmeros obstáculos e andar sobre telhados precários. Dedicação e empenho em não deixar nenhuma vida para trás eram características fundamentais para o trabalho, já que, se fugissem, os animais corriam o risco de não serem mais encontrados e ficarem, de vez, à própria sorte.
Levei umas quatro ou cinco mordidas, mas até que foi uma boa média para 111 cachorros resgatados. Estavam todos hipotérmicos, há dias sem comer. Era um cenário de guerra. Nunca imaginei aquilo em 56 anos de vida– relembra
Além da experiência em navegar em condições adversas, Gerard dispunha de uma boa máquina consigo, que o ajudou a arrombar portões e passar por cima de troncos e carros submersos. Pelas redes sociais, elogiou o desempenho do Sea-Doo Explorer, jet que considera “indestrutível”.
“É perfeito para resgates. O sistema IDF me salvou umas 30 vezes, porque limpa a turbina quando entram detritos — e detrito era o que mais tinha nessas águas. Reboquei barcos com 20 vezes o peso dele”, afirmou.
Ao lado de dezenas de voluntários naturais de todas as partes do Brasil, o empresário levou o jet para outras cidades. Além de Porto Alegre, atuou em Eldorado do Sul, Vale Verde e Mathias Velho. Por lá, fez amizades embasadas na solidariedade, incluindo com um revendedor da Sea-Doo de Belém, que comprou um jet para ajudar as vítimas do desastre climático.
O cenário desolador que se desvelava a olhos vistos nas cidades ficou marcado em Gerard. Além dos locais submersos, os voluntários precisavam lidar com as vidas que não conseguiram salvar e com a segurança nas cidades. Por conta de brigas entre facções, algumas só eram acessadas com escolta armada.
Em contrapartida, o cuidado e carinho com que os animais eram tratados se mostrou um ponto de esperança. Ao chegarem na parte seca da cidade, recebiam os primeiros cuidados médicos, alimentação, mantas e muito chamego.
Foi difícil não trazer uns 30 [animais] para casa. O que me consolava era o exército de voluntários que os recebia– revela
Durante o tempo que passou nas terras gaúchas, Gerard ficou primeiro na casa de um amigo e depois em um hotel sem funcionários, apenas para descansar. “A gente saia às 7h e voltava às 20h, 21h, só para derrubar o corpo”, conta.
Agora que voltou à tranquilidade do lar, Gerard conta que dá ainda mais valor ao que tem, começando pelo básico do dia a dia. Esse sentimento, somado a tudo o que viu, é o que o faz continuar o trabalho e a fazer um apelo: a ajuda não pode parar. “A gente tem que se solidarizar e doar. Essas pessoas vão precisar de muito tempo de doação para voltar ao mínimo de normalidade”, reforça.
Comunidade náutica unida em solidariedade
Além de muitos voluntários do mundo náutico, como Gerard, muitas iniciativas para levar ajuda ao Rio Grande do Sul surgiram entre as empresas do setor. A Villa Náutica, empreendimento do carioca, receberá doações pelos próximos três meses. “A gente paga o frete e manda para o Rio Grande do Sul”, ele explica. A empresa tem lojas em Brasília, Goiânia e Campinas.
Por sua vez, a NautiSpecial, que desenvolve produtos de limpeza biodegradáveis para barcos, vai doar 20% de todas as vendas realizadas no site para os Velejadores Solidários RS. O estaleiro pernambucano NX Boats colaborou financeiramente com o Instituto Cultural Floresta, que está atuando em várias ações nas enchentes.
A NTC Company, que tem sede no estado gaúcho, enviou plataformas flutuantes para os afetados na tragédia. Já a Kamell doou mercadorias para a manutenção de embarcações que trabalhavam nos resgates.
A Yamaha também contribuiu com roupas, motores de popa, óleo para os motores e hélices, além de transportar doações de terceiros. Diversas outras companhias do mercado náutico revelaram à reportagem que desenvolveram ações em prol dos gaúchos, mas preferiram não divulgá-las.
Campanha NÁUTICA + CUFA
O Grupo Náutica também entrou na corrente e uniu forças com a Central Única das Favelas (CUFA) para unir quem ama navegar com quem mais precisa de um barco nesse momento.
Caso você tenha um barco pequeno, ou conheça alguém que possua um e gostaria de ajudar, entre em contato com a CUFA pelo e-mail [email protected] ou pelo WhatsApp (11) 95958-2933.
Além da ajuda com embarcações, todos podem contribuir de qualquer lugar e com qualquer valor via PIX, através da chave [email protected]. O dinheiro arrecadado pela instituição é destinado a compra de itens essenciais, como mantimentos, água, produtos de higiene e colchões, por exemplo.
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