Grande, saboroso e raro: catarinense constrói barco-indústria para pesca do camarão-carabineiro
Pouco conhecido no Brasil, iguaria agora ganha espaço nos melhores restaurantes do país
Raro em nossas mesas, o camarão-carabineiro, também conhecido como camarão-vermelho, de repente começou a ganhar espaço em alguns dos melhores restaurantes de capitais como Rio, Florianópolis, Porto Alegre e São Paulo. Também caiu (metaforicamente, claro) na boca de todo mundo.
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A entrada triunfal no país deve-se, entre outros fatores, ao faro para bons negócios do empresário da pesca Manoel Francisco Cordeiro Neto, dono do primeiro e (até agora) único barco brasileiro dedicado à pesca do crustáceo: o Cordeiro de Deus E, construído em Itajaí, com 27 metros de comprimento (88,5 pés) e 7,5 metros de boca, que entrou em operação, em fase de teste, há quase um ano.
A rigor, a pesca do camarão-vermelho, da família Aristeidae (espécie A. edwardsiana), teve início em nossas águas 20 anos atrás, e se concentrou somente entre 2002 e 2009.
Iguaria do fundo do mar (do fundo mesmo, pois ele é pescado entre 200 e 1400 metros abaixo da linha d’água, em fundos de areia e lodo), o carabineiro era capturado por embarcações estrangeiras que receberam autorização para explorar a Zona Econômica Exclusiva (ZEE) brasileira, faixa entre 12 e 200 milhas marítimas além da costa.
Eram os chamados barcos-indústrias, nos quais os animais capturados são limpos, embalados e congelados ainda a bordo, feito uma linha de montagem. Toda produção ia direto para os mercados de pescados da Península Ibérica. Mas a autorização caiu e, desde então, a pesca do camarão-vermelho ficou paralisada no Brasil, pois não dispúnhamos de tecnologia para esse tipo de pesca, de águas profundas.
Até que Manoel Cordeiro entrou na história, com seu barco feito sob medida para as suas necessidades de pescador. “A espécie existe no Brasil e ninguém pescava, por falta de uma embarcação adequada. Eu vi que era uma ótima opção. Aí, decidi fazer o meu barco, com casco de aço, a partir de um projeto que adquiri na Irlanda, próprio para navegar em mar turbulento. Tem 600 toneladas de concreto de lastro”, conta o empresário.
Preparado para funcionar em alto-mar tal qual uma fábrica, a embarcação tem uma câmara frigorífica no porão, revestida de inox, onde os camarões são processados, embalados e congelados à temperatura de 35°C negativos, permanecendo armazenados até a chegada ao porto mais próximo, quando são descarregados (por um munck, equipamento hidráulico para içamento instalado no próprio barco) já prontos para exportação ou consumo.
“Temos um túnel de congelamento rápido e uma câmara fria, cada um com três compressores. A manipulação é mínima, praticamente só vão colocar a mão na indústria”, explica o Manoel. Isso faz com que cheguem o mais fresco possível ao consumidor.
O projeto privilegiou também a qualidade de vida da tripulação de 10 pessoas, que passa longas jornadas no mar. O Cordeiro de Deus E conta com áreas externas cobertas, ar-condicionado, cozinha com mármore e água filtrada, o que permite estender a viagem por até mais de 30 dias, se necessário — na última saída, por exemplo, foram 34 dias de mar.
Na construção, iniciada em abril de 2017, foram usadas 110 toneladas de aço, cumprindo todas as exigências determinadas pela União Europeia. Para empurrar tudo isso, há um motor de 640 hp. Além disso, está equipado com dois geradores de 140 kVA cada.
Chama atenção o “E” no final do nome do barco. Manoel explica: é uma referência ao Espírito Santo, ao qual ele atribui a cura de um câncer; além disso, Manoel gravou no casco do barco a frase “Nosso combustível é o Espírito Santo”. Uma segunda embarcação desse modelo já está em construção em Itajaí, agora sob encomenda de uma indústria de Florianópolis, que também pretende aderir à atividade.
Mas que camarão é esse?
Muito conceituado e consumido em Portugal e na Espanha (onde é indispensável na preparação da paella), o camarão carabineiro é uma espécie mais saborosa, graúda (35 centímetros de comprimento), de coloração avermelhada, gosto intenso de mar e qualidade excepcional.
Explorada principalmente no Algarve e nas Ilhas Canárias, a espécie costuma ser servida cozida ou grelhada rapidamente, quase crua, nos bons restaurantes ibéricos. Isso significa que qualquer um consegue fazê-lo a bordo de seu barco.
Sua captura, porém, não é uma operação simples. Pelo contrário. “É uma pesca de profundidade, muito difícil, que acontece longe da costa, em fundo de areia e lodo”, diz Manoel. “Mas, cada vez que dá certo, o carabineiro sobe ao barco com uma cor tão linda que me deixa encantado. Isso, junto com o aquecimento do mercado, me motivou a construir meu próprio barco”, acrescenta.
Filho de pescador artesanal — e de uma família intimamente ligada ao mar –, Manoel, quando criança, vendia camarão na praia, em Itajaí, e ajudava o pai a arrumar a rede. Aos 16 anos começou a trabalhar embarcado. Aos 25, era mestre de um pesqueiro de cação-anjo.
Com suas economias e a ajuda do pai e do irmão, em 2002 ele montou e equipou um barco, o Cordeiro de Deus, com o qual recebeu autorização para pescar o peixe-sapo, iguaria igualmente muito apreciada no exterior.
Agora, aos 54 anos, tornou-se proprietário do único barco-fábrica brasileiro, que tem como base um cais próprio da Cordeiro Pescados, no bairro Machados, em Navegantes. Até o momento em que conversou com a reportagem de NÁUTICA, o barco havia saído para pescar cinco vezes.
“Foram três viagens pequenas, de teste, e duas completas, entre Florianópolis e Cabo Frio. Ainda estamos em fase de treinamento, até pegar todos os macetes desse tipo de pesca. Estamos aprendendo. É muito pesado para arrastar”, explica Manoel, que antes do batismo do Cordeiro de Deus E fez um tour por alguns países da Europa, como Dinamarca, Portugal e Espanha, para aprender com gente experiente.
“Até o final de 2023, vamos poder determinar qual é a melhor época do ano para a pesca, se no inverno ou no verão; qual é a melhor área para jogar a rede e qual é a melhor técnica”, acredita.
A cada saída, o barco de aço de 88,5 pés afasta-se cem milhas do continente e navega com uma rede de arrasto no fundo do oceano. E só volta à terra para descarregar e se reabastecer no porto mais próximo de onde estiver localizado. Cada viagem rende cerca de 5 toneladas.
Obedecendo as leis de mercado (quanto menor a oferta, maior o preço), no Brasil o camarão-carabineiro chega a custar R$ 400 o quilo. Esse valor se refere ao animal inteiro, com casca, patas, antenas, cabeça e vísceras. Nos restaurantes, pratos com apenas uma unidade do crustáceo vermelho podem custar R$ 180 ou mais.
A pouca oferta do produto, no entanto, não se deve à escassez do animal e sim à dificuldade em pescá-lo no fundo do mar. O carabineiro é conhecido dos oceanógrafos e biólogos marinhos, que o descrevem como abundante nas costas do Sul e do Sudeste do Brasil. Conforme a produção aumentar, o carabineiro ficará mais famoso nos pratos dos brasileiros.
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